Mais de 2 milhões de participantes da Imagine Cup mudaram o mundo em 20 anos de inovação

Por Susanna Ray 

 

Dois estudantes universitários, em isolamento por causa da pandemia durante um semestre no exterior, acabaram se apaixonando – e então tiveram uma ideia que poderia mudar a maneira como cientistas e engenheiros de todo o mundo conduzem suas pesquisas. 

Ahmed Kamel, um estudante egípcio de ciência da computação, e Bukle Unaldi, uma aluna de neurociência da Turquia, se conheceram na Minerva University em São Francisco e estavam estudando em Buenos Aires em 2020. Então, veio a pandemia, impedindo-os de realizar o trabalho de laboratório que seus diplomas exigiam. Eles aproveitaram a situação para criar uma solução: fazer um braço robótico que pudesse ser operado remotamente, simulando uma experiência de laboratório presencial. 

Sua inovação promete trazer um benefício tão grande para pesquisadores – especialmente em países em desenvolvimento ou de grupos desfavorecidos com acesso limitado a equipamentos e laboratórios – que os juízes da Imagine Cup de 2021 escolheram o projeto para avançar para o prestigiado Campeonato Mundial da competição. 

O evento de tecnologia global exclusivo da Microsoft, que está em sua 20ª edição, já recebeu mais de 2 milhões de estudantes de 160 países competindo por prêmios que incluem treinamentos, mentorias, tecnologia, publicidade e dinheiro. Essa rica história servirá de apoio às próximas gerações de desenvolvedores e criadores, conforme elas contribuem para a indústria de tecnologia e criam soluções para problemas globais. 

Bukle Unaldi e Ahmed Kamel (Foto por Berfin Karaman)

“O mais importante não foi o dinheiro ou os prêmios, mas a credibilidade que a experiência nos deu para nosso projeto e para nossos currículos, para nos ajudar a conseguir empregos depois que nos formamos no ano passado”, diz Kamel. 

“Ter o apoio da Microsoft e o reconhecimento por mostrar nosso projeto ao mundo nos deu muita confiança e com esse impulso conseguimos reunir uma equipe para trabalhar mais nele”, explica Unaldi. 

Mais de 600 estudantes universitários usaram o robô que os recém-casados patentearam no ano passado. Eles montaram o robô como um “agregado” da família em seu apartamento enquanto procuram um escritório em Seattle, onde Kamel conseguiu um emprego como engenheiro de robótica para a Amazon e Unaldi como professora remota para a Elite Open School. Eles mantêm o robô conectado 24 horas por dia, 7 dias por semana, para trabalhar em qualquer fuso horário e estão criando uma empresa, a Hands-On Labs, enquanto se preparam para expandir para escolas on-line de ensino fundamental e médio. 

O robô operado remotamente criado por Ahmed Kamel e Bukle Unaldi (Foto por Kamel)

O vencedor da Imagine Cup deste ano vai ser anunciado no dia 24 de maio na Build, conferência anual da Microsoft. Estudantes podem participar e aprender ao lado de desenvolvedores profissionais em sessões virtuais gratuitas criadas com curadoria especial. 

A imagine Cup já foi considerada a “Olimpíada do design de software” por um jornalista da revista WIRED e hoje oferece ao campeão mundial US$ 100.000 em dinheiro, suporte tecnológico e uma sessão de mentoria com o CEO da Microsoft, Satya Nadella. Este ano, ela atraiu competidores mais diversos do que nunca: 67% das equipes incluem mulheres e 17% são compostas por estudantes do ensino médio, diferente dos estudantes universitários das edições anteriores. 

“A Imagine Cup é um ótimo exemplo das possibilidades”, diz Nadella, que atuou como juiz durante seu primeiro ano como CEO em 2014 e orientou todos os campeões mundiais desde então. “Por 20 anos, os alunos nos mostraram o que é possível quando se unem para aplicar a tecnologia para ajudar a resolver os desafios do mundo”. 

O vencedor do grande prêmio do ano passado foi o Team REWEBA, que criou seu nome a partir da sigla para “Remote Well Baby”. 

Os membros da equipe eram voluntários em um hospital enquanto estudavam tecnologia de computação aplicada em uma universidade no Quênia. Eles viram os desafios enfrentados por novas mães nas áreas rurais. As longas viagens para o hospital faziam com que as mães perdessem exames mensais dos recém-nascidos, o que levava a uma alta taxa de mortalidade infantil. O grupo percebeu que a tecnologia poderia resolver o problema e criou um dispositivo de monitoramento baseado em IoT que os profissionais de saúde nas aldeias podem usar para coletar remotamente o peso, a altura e a temperatura de um bebê. O dispositivo integrado envia automaticamente os dados aos médicos, servindo como um sistema de alerta para salvar a vida dos bebês. 

“É um problema muito emocional”, diz Jeet Gohil, que hoje é desenvolvedor de software e está trabalhando junto com o colega de equipe Abdihamid Abdi para viabilizar a produção do protótipo, para que possa ser distribuído para uso comercial. “Vimos as mães e os bebês sofrendo e queríamos realmente ajudá-los”. 

O time REWEBA fez uma call de mentoria com Satya Nadella, CEO da Microsoft, após vencer o Campeonato Mundial na Imagine Cup de 2021.

A equipe se reunia semanalmente com mentores da Microsoft para aprimorar o software do protótipo ao longo da Imagine Cup. E a alta visibilidade do evento criou uma comunidade forte e oportunidades de networking que abriram inúmeras portas, diz Khushi Gupta, que agora estuda no Texas e recentemente solicitou uma patente para o trabalho do grupo. 

No entanto, as equipes da Imagine Cup costumam vencer independentemente de sua colocação na competição. 

Zbynek Poulicek foi vice-campeão em 2010 com seu mapa colaborativo – um conceito novo na época – que possibilitou às equipes de resgate tchecas guiarem umas às outras até as vítimas presas nos escombros de um terremoto no Haiti. A solução permitiu a orientação em terreno difícil, sem marcos geográficos depois que eles desmoronaram nos tremores. Poulicek viu a cobertura da TV sobre o desastre no Haiti e, em um impulso de inspiração e audácia, entrou em contato com chefe de uma organização sem fins lucrativos tcheca. Ele recebeu uma ligação imediata: eles precisavam do conceito dele imediatamente. 

“Eu percebi que a tecnologia realmente podia fazer a diferença”, explicou Poulicek. 

O cofundador da Microsoft, Bill Gates, mostrou o projeto em um post no blog Gates Notes, apresentando-o como um exemplo do impacto que as ideias da Imagine Cup podem ter no mundo real, e Poulicek foi convidado a fazer um discurso motivacional no evento de 2011. Ele e sua equipe sentiram a responsabilidade e a confiança para continuar aprimorando seu protótipo e fundaram a GINA Software, sigla para Geographic Information Assistant. 

Zbyněk Poulíček (na frente) e o time da Imagine Cup em 2010 (Foto por Jiří Salik Sláma)

Estar no Imagine Cup World Championship e receber feedback de concorrentes de todo o mundo ajudou a preparar Poulicek para ser CEO de uma empresa que agora faz negócios em mais de 50 países, com mais de 250 mil usuários ativos em organizações humanitárias e unidades de primeiros socorros. 

“Se não fosse pela Imagine Cup, eu não acreditaria que tinha o poder de criar algo que pudesse ter impacto global”, lembra Poulicek. “Agora o GINA é usado em todo o mundo nas situações mais difíceis, ajudando centenas de milhares de usuários a se manterem seguros”, completa. 

A competição originalmente tinha como objetivo divulgar o setor de tecnologia para estudantes. Ao longo dos anos, o foco se concentrou na construção de soluções reais nas categorias terra, educação, saúde e estilo de vida, e os projetos evoluíram à medida que a tecnologia se tornou mais acessível. As soluções inscritas pelos participantes são mais sofisticadas e completas, com algumas atraindo financiamento rapidamente e se tornando produtos comerciais. 

Mas esse não é o objetivo final. 

“A Imagine Cup está associada à nossa missão principal: como ajudamos os alunos a alcançar mais?”, explica Charlotte Yarkoni, que supervisiona os programas de desenvolvimento estudantil como presidente de Comércio e Ecossistemas da Microsoft na divisão de Nuvem e Inteligência Artificial. “Tem sido uma maneira de ajudar esse ecossistema e a comunidade em geral. É surpreendente quando você reflete sobre os motivos profundamente pessoais que trouxeram esses alunos até aqui, como eles estão tentando ajudar um grupo carente ou uma comunidade necessitada ou até mesmo um parente. A quantidade de inovação e o ritmo dela são inacreditáveis”. 

“A Microsoft está profundamente comprometida em capacitar a força de trabalho e os tomadores de decisão de amanhã”, diz Yarkoni. “A medida final é: estamos ajudando os alunos a sair e causar impacto?” 

Antes da Imagine Cup, eu era estudante; depois da Imagine Cup, eu saí preparada para o mundo”. 

A equipe de Bianca Letti venceu o Campeonato Mundial de 2015 criando um software que personalizava padrões de roupas para atender pessoas de todas as formas e tamanhos e desenvolvendo um marketplace para que costureiras façam as roupas. A equipe entrou na competição para buscar financiamento para seu projeto. 

Mas o impacto duradouro, diz Letti, foi nas habilidades que ela aprendeu: como estruturar seus pensamentos e fala para um elevator pitch; como lidar com a pressão de estar no centro das atenções; e como continuar treinando e ensaiando depois de ficar nervosa e esquecer a metade de seu discurso de três minutos em um treino para a rodada final da competição. 

“Eu levo isso para a vida, isso muda tudo em qualquer reunião que eu participe”, diz Letti. “Foi uma experiência transformadora para mim. Antes da Imagine Cup, eu era estudante; depois da Imagine Cup, eu saí preparada para o mundo”. 

O tema da competição também evoluiu ao longo dos anos, de “Imagine um mundo onde a tecnologia ajuda a resolver os problemas mais difíceis” para “Sonhe. Construa. Viva isso.” Mas o mantra duradouro é permitir que os alunos decidam quais problemas e sonhos eles querem enfrentar e como. 

“Os alunos conhecem os problemas de suas comunidades melhor do que ninguém; estamos apenas fornecendo a plataforma”, diz Pablo Veramendi, da Microsoft, que administrou as últimas sete competições da Imagine Cup. “Ver do que esses alunos são capazes e a diferença que eles querem fazer no mundo me enche de esperança para o que essa próxima geração de desenvolvedores fará. Eles são jovens, talentosos e motivados e mergulham de cabeça para resolver esses problemas”, conclui. 

Foi isso que Masaki Takeuchi fez. Ele estava estudando ciência e informação em uma universidade japonesa quando descobriu que pessoas no mundo inteiro são incapazes de usar suas cordas vocais devido ao câncer de garganta e outras doenças. Tocado, ele mergulhou no projeto de um wearable (dispositivo eletrônico vestível) que cria sons digitais que imitam a fala de uma pessoa, traduzindo as vibrações conforme elas movem a boca e a língua. 

Masaki Takeuchi, segundo da direita para a esquerda, e seu time demonstram o uso de seu wearable para a Imagine Cup de 2020 . (Foto por Keisuke Shiro)

Mas Takeuchi não tinha como alcançar quem precisa de sua tecnologia e não tinha dinheiro para desenvolvimento até competir na Imagine Cup de 2020. Sua equipe chegou ao Campeonato Mundial e a atenção da mídia ajudou a promover conexões com potenciais usuários, engenheiros e doadores. Ele agora está cursando o doutorado e trabalhando para tornar o tom do dispositivo mais próximo da voz humana e torná-lo mais confortável de usar. Takeuchi pretende patenteá-lo e começar a vendê-lo dentro de dois anos. 

“Se eu não tivesse participado da Imagine Cup, esse projeto poderia ter acabado”, diz Takeuchi, que usou o dinheiro do prêmio para contratar um engenheiro de design. “Quero que muitas pessoas possam usar este dispositivo e criar mais aplicativos para ele”, finaliza. 

Masaki Takeuchi criou um wearable que auxilia pessoas que perderam o uso de suas cordas vocais. (Fotos por Shoki Hattori e desenhos por Yuki Ogasawara)

A lista de conquistas de participantes ao longo de 20 anos da Imagine Cup é longa, incluindo as dezenas de milhares de projetos inscritos e os que surgiram após a competição, usando o que aprenderam e as conexões que fizeram. 

“Vimos inovações extremamente atraentes como resultado do conjunto diversificado e global de ideias apresentadas”, conta Yarkoni. “É nossa responsabilidade manter este programa funcionando e ajudar esses alunos a realizar seus sonhos. São pessoas inteligentes e brilhantes e queremos equipá-las para o sucesso”. 

 


Foto no topo: Bianca Letti (ao centro) e a equipe eFitFashion venceram o campeonato mundial na Imagine Cup de 2015. 

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