Setor financeiro aposta na IA para atender melhor os clientes

Por Michel van der Bel, presidente da Microsoft EMEA

O setor de serviços financeiros passa por uma enorme transformação. As empresas de tecnologia financeira (fintechs) desafiam companhias tradicionais, enquanto integrantes de outros setores, como varejo e tecnologia, entram em seu território.

Além disso, os clientes exigem cada vez mais serviços preditivos, proativos e rápidos. As instituições financeiras de hoje precisam garantir que todas as interações com os clientes – independentemente do canal – sejam implementadas sem problemas e agreguem valor, se quiserem ser líderes do setor no futuro.

A concorrência das fintechs é real, e as instituições estabelecidas estão reduzindo sua dependência de sistemas legados e descobrindo novas maneiras de alavancar os canais digitais – e os dados estão no centro dessa transformação.

Tive o prazer de discutir a transformação do setor de serviços financeiros com Spiros Margaris, investidor de risco, consultor sênior e influenciador internacional de IA, blockchain e fintechs. Nossa conversa segue abaixo e espero que ofereça alguns insights úteis.

Michel van der BelMichel van der Bel, presidente da Microsoft EMEA

Como presidente da Microsoft EMEA (Europa, Oriente Médio e Ásia), trabalho com 20.000 funcionários em 32 subsidiárias com uma única visão: ajudar os clientes a se transformarem para competir em um mundo onde a inovação tecnológica está se aproximando do coração de cada negócio. Trabalhei com três CEOs ao longo de 20 anos e vi em primeira mão como eles desenvolveram a cultura em torno deles. Aprendi que as pessoas só podem ter o melhor desempenho se puderem colaborar em um ambiente que incentive o empoderamento, e é por isso que acredito que a cultura é tão vital para cada organização.

Spiros MargarisSpiros Margaris, investidor de risco e fundador da Margaris Ventures

Spiros é um investidor de risco, consultor sênior e a única pessoa que alcançou o título “The Triple Crown” em rankings de influenciadores ao ser considerado pela Onlaytica o influenciador número 1 em FinTechs, Inteligência Artificial (IA) e Blockchain. Margaris foi classificado como influenciador número 1 em Insurtechs (tecnologia de seguros) pela InsurTechnews e aparece regularmente nas três primeiras posições dos rankings mundiais de influenciadores do setor. Tem mais de 25 anos de experiência internacional em gestão de investimentos e startups.

MvdB: Quais são os casos atuais de uso de inteligência artificial nos serviços financeiros – estão evoluindo como esperado ou as instituições financeiras ainda tentam descobrir como são as coisas? Como estão aplicando a IA para gerar resultados para seus negócios?

SM: Acho que bancos, instituições financeiras e seguradoras devem colocar todos os seus esforços e recursos em IA e aprendizado de máquina, porque essas tecnologias fornecerão aos seus clientes orientações mais personalizadas, que é o que as pessoas estão acostumadas. Conveniência é uma das minhas palavras-chave. Se você quer ser realmente bem-sucedido, precisa criar produtos que sejam muito convenientes para o cliente, porque as pessoas não querem tomar decisões complexas, essa é a realidade.

Se você está no setor financeiro, acho que a inteligência artificial deveria estar no topo de sua lista de prioridades – não porque tomará o lugar das pessoas, mas porque pode ajudar a melhorar suas habilidades. Você pode dar a elas ferramentas que as tornem melhores banqueiros, melhores corretores de seguros e muito mais.

MvdB: As instituições financeiras estão adotando fintechs para ajudar a superar os desafios? Veem isso como uma oportunidade ou como uma ameaça de ruptura para seus negócios?

SM: Se as fintechs fossem autônomas, não acho que os bancos se apressariam a evoluir. As instituições financeiras provavelmente não perderão muito sono com as fintechs nos próximos três a cinco anos. De outro lado, os bancos e as seguradoras veem uma série de grandes empresas de tecnologia olhando para fintechs e insurtechs, que podem ameaçar seus próprios clientes – algo que a Microsoft não está fazendo. Muitas empresas de tecnologia veem as fintechs e as startups como facilitadoras para entrar no mercado financeiro. De repente, essas facilitadoras poderiam se tornar muito poderosas, rapidamente, e isso é um grande equívoco do mercado financeiro.

Essas empresas de tecnologia não querem se tornar bancos. Para elas, trata-se de agregar valor a seus clientes. Se você puder oferecer a um cliente vários serviços de fintech, é mais provável que ele escolha a conveniência de sua plataforma.

Se você quer ser realmente bem-sucedido, precisa criar produtos que sejam muito convenientes para o cliente, porque as pessoas não querem tomar decisões complexas

MvdB: Interessante. Parece que elas não pretendem se tornar bancos, mas estão tentando assumir a responsabilidade do cliente e acabam sendo concorrentes de parte do negócio.

SM: Correto. Estamos vendo todo o negócio de seguros indo em uma direção na qual a interação com os consumidores se torna o foco principal. Quanto mais você interage com o cliente, mais ele se acostuma à sua marca.

MvdB: Há muitas empresas esperando pela revolução tecnológica, mas na minha opinião, a revolução já está aqui. Vejo muitos exemplos, incluindo inteligência artificial. Qual é a sua percepção da transformação digital no setor financeiro?

SM: No setor bancário, percebi que é muito mais fácil tomar decisões melhores ao investir quantias menores. Você tem melhor desempenho e agilidade como uma pequena empresa com mentalidade de startup. Acontece o mesmo com instituições financeiras. Elas têm um legado que precisa ser mantido, renovado e, às vezes, a política e a cultura corporativa tornam quase impossível ser ágil – e isso inclui adotar novas tecnologias para ajudá-las a se transformar.

Vimos grandes instituições financeiras mostrarem que é possível gerenciar suas operações legadas e negócios cotidianos, enquanto, ao mesmo tempo, quase separadamente, promovem uma mentalidade de startup, mais ágil para a transformação. Novos empreendimentos de risco significam que essa mentalidade de startup deve ser separada, o que, naturalmente, também significa que mais dinheiro deve ser gasto.

online banking

MvdB: É interessante ouvir como outras grandes instituições estão refletindo e gerenciando sua transformação, particularmente no que diz respeito a abrigar diferentes mentalidades para diferentes áreas do negócio. Na Microsoft, ainda estamos no meio do nosso processo de transformação e, enquanto não chegamos ao final, progredimos e aprendemos o tempo todo.

SM: Sinceramente acho que a Microsoft fez um trabalho fantástico em se transformar com sua nuvem e muitos outros serviços – e isso é refletido pelos profissionais e o mercado em geral. É incrível ver como o raio caiu duas vezes no mesmo lugar. A empresa reinventou o negócio e cresceu, quando poderia ter escolhido permanecer estagnada.

MvdB: Testemunhei nossa mudança de uma cultura “saiba tudo” para uma que incentiva uma mentalidade de crescimento, e isso se resume a cultura e mentalidade. Acho que estamos no meio de uma experiência de aprendizado e de mentalidade de aprendizado, onde todas essas pequenas coisas começam a importar. Você acha que essas duas coisas estão se tornando um fator central de transformação, além de simplesmente introduzir novas tecnologias?

SM: Sim, certamente. Nas startups, vemos uma cultura em que, se houver um problema, as pessoas se sentam e resolvem. Compare isso com a política e a burocracia de uma grande corporação, e você pode ver como a cultura errada pode desencorajar as pessoas, independentemente da tecnologia disponível. As pessoas gostam de ver que sua contribuição faz diferença, e isso é muito mais difícil em grandes organizações.

MvdB: Se você está operando com mais de 100.000 pessoas globalmente, certamente é um desafio, mas, ao mesmo tempo, você precisa ter certeza de que desperta essa mentalidade de startup nas pessoas. Eu acho que é aqui que o elemento da cultura na liderança se torna um fator fundamental na mudança de uma organização.

SM: Isso vem do topo.

MvdB: Sim. Isto é verdade para nós também. Se você toma Satya (Nadella, CEO da Microsoft) como exemplo, ele está vivendo o que quer que esta empresa seja.

Se nos concentrarmos no lado tecnológico da transformação, especificamente em dados, você acha que os dados são hoje a moeda mais importante nos negócios?

SM: Sim. Mas há muitos dados, muito ruído. Não são apenas os dados, mas como você usa esses dados. Todos, incluindo os grandes bancos, têm dados, mas é o raciocínio por trás disso que conta – usando cientistas de dados, algoritmos, IA, aprendizado de máquina e muito mais – para extrair algo. É aí que entram a IA, o aprendizado de máquina e as pessoas por trás dos algoritmos.

MvdB: Concordo. Faço essa pergunta porque acho que há muitas percepções equivocadas sobre os dados serem o novo petróleo deste século. É um ótimo slogan no papel, mas a questão é que os dados sozinhos são apenas dados, e serão sempre.

Os dados precisam ser transformados em algo significativo, útil e impactante. Pense nisso como um carro – IA e aprendizado de máquina são o motor, e os dados, o combustível

SM: Os dados precisam ser transformados em algo significativo, útil e impactante. Pense nisso como um carro – IA e aprendizado de máquina são o motor, e os dados, o combustível. Então, precisamos de um motorista ou nada acontece. Você precisa decidir em qual direção colocar os dados. Você deseja fornecer serviços mais personalizados e recomendações individuais para seus clientes, grandes ou pequenos.

MvdB: Definitivamente, há uma oportunidade quando se trata de usar dados – por exemplo, detectar fraudes. Há também, como em todas as mudanças tecnológicas, a questão da ruptura. Qual é sua avaliação disso?

SM: Todos nós devemos aceitar o fato de que a ruptura e a mudança estão à frente – negar isso vai contra a realidade. No entanto, parte dessa realidade é o fato de que a tecnologia também criará novos empregos, e acredito que as pessoas e organizações devem considerar a reciclagem como uma oportunidade. É possível que as organizações ajudem as pessoas na experiência e as levem ao próximo nível.

MvdB: Concordo, especialmente no que diz respeito à qualificação e às oportunidades. A Microsoft acredita firmemente que a transformação não se trata de homem ou máquina, mas de homem e máquina. O tema da confiança também é muito relevante. Você está conversando com alguma instituição ou governo sobre a necessidade de habilidades ou reciclagem, ou, a longo prazo, como devemos olhar para os nossos sistemas educacionais?

SM: Estive recentemente em Bruxelas exatamente para este tópico, com reguladores de seguros. IA, algoritmos, aprendizado de máquina e outras tecnologias mudarão as coisas, é claro. Na minha opinião, devemos dizer às pessoas que é importante aprender novas habilidades e que as organizações e empresas estão lá para ajudá-las.

MvdB: Ser membro de vários conselhos, viajar e discutir questões-chave com tantos grupos diferentes de pessoas deve ser muito estimulante, para não mencionar gratificante. Também imagino que é uma ótima experiência de aprendizado. De que outra forma você aprende e cresce pessoalmente nestes dias, especialmente em um ambiente repleto de tantas informações de tantas fontes diferentes?

SM: É definitivamente gratificante, e superinteressante, receber tantos pontos de vista diferentes em discussões estimulantes. Além disso, garanto que leio muito, constantemente. Estou sempre lendo coisas de várias fontes, mesmo que sejam contrárias às minhas crenças. Acredito que, desse modo, posso encontrar a verdade no meio termo.

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