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Breech Odu trabalha em um laboratório da Oxford Biomedica

Com lições aprendidas dos computadores, uma nova plataforma pode ajudar na produção de terapias biológicas capazes de salvar vidas

Nos últimos anos, as empresas descobriram como criar bactérias para produzir cimento, ajudando a reduzir a poluição envolvida na fabricação tradicional. Utilizando tecnologias mais avançadas, cientistas até programaram células do sistema imunológico de pacientes para reconhecer e matar células de leucemia, prolongando os anos de vida  de crianças que virtualmente não possuíam nenhuma chance de sobrevivência.

Tudo isso é possível porque introduzir uma sequência de DNA fabricada em uma célula viva a faz reagir de uma forma nova e transformadora.

Pesquisadores acreditam que a habilidade de programar a biologia tem um enorme potencial para transformar a forma como produzimos inúmeras coisas, desde remédios e químicos a comida e combustível. No entanto, prever quais das milhões de combinações de fatores genéticos e ambientais irão trazer os resultados desejados ainda é algo caro, difícil e exige um esforço muito artesanal. Estamos muitos passos além da pura sorte, mas cada caso de sucesso exige meses ou até mesmo anos de experimentos falhos antes de funcionar.

“Imagine que você está tentando pousar um foguete na Lua, mas não entende as leis da física o suficiente ou não possui meios para controlá-las precisamente. Você teria sorte se chegasse minimamente perto de pousar”, disse Andrew Phillips, que chefia o Grupo de Computação Biológica no laboratório de pesquisa da Microsoft em Cambridge, no Reino Unido. “Mas se compreender as equações que regem o comportamento do foguete e se for capaz de controlá-las, você pode determinar para onde ele irá.”

Por milhares de anos, as pessoas aproveitaram processos biológicos para fazer coisas que nós não somos capazes de fazer, como usar as leveduras de cerveja para fermentá-la. As instruções que dizem à levedura quais proteínas ela deve criar e como realizar as operações complexas que transformam ingredientes crus em uma bebida espumosa estão codificadas no DNA da levedura. No entanto, se inserirmos um novo DNA na levedura, podemos programá-la com novas instruções capazes de criar todo tipo de coisa.

Os pesquisadores da Microsoft passaram anos estudando esses processos estruturais e aprendendo a influenciá-los. Atualmente, eles estão colaborando com a Universidade de Princeton e as empresas Oxford Biomedica e Synthace do Reino Unido para desenvolver e testar uma plataforma integrada, designada a ajudar outras companhias e grupos de pesquisadores a realizarem este trabalho de forma mais segura. O objetivo: reduzir a quantidade de tentativa e erro necessária para fazer descobertas científicas benéficas e permitir às empresas e pesquisadores acadêmicos já estabelecidos no ramo operar de forma mais eficaz e com menor custo.

O projeto, chamado Station B, procura desenvolver uma plataforma de ponta a ponta – incluindo um conjunto de soluções de software, uma forma de automatizar os experimentos em laboratório e os métodos de aprendizado de máquina que rodam na nuvem Azure da Microsoft – para ajudar os cientistas a canalizar, de forma mais eficaz e previsível, o poder das melhores máquinas de processamento de informações da vida: células vivas.

Andrew Phillips, chefe do Grupo de Computação Biológica da Microsoft
Andrew Phillips, chefe do Grupo de Computação Biológica da Microsoft que desenvolveu a plataforma Station B. (Foto: Jonathan Banks)

Os pesquisadores da Station B estão trabalhando para aplicar nos sistemas biológicos o mesmo rigor que propicia resultados previsíveis em programação computacional. A plataforma utiliza a experiência da Microsoft no desenvolvimento de linguagens de programação e compiladores e em aplicar novos princípios para gerar sequências de As, Ts, Cs e Gs, que representam os blocos de construção do DNA em vez de código binário. Ela usa modelos computacionais para descrever interações dentro de uma célula complexas demais para humanos analisarem apenas com computadores e planilhas.

A primeira colaboração acadêmica a testar a plataforma Station B, composta de microbiologistas e físicos da Universidade de Princeton, irá investigar a formação de biofilmes – camadas finas e viscosas de bactéria que se constroem em superfícies e contribuem para processos que vão desde infecções médicas até sujeira industrial. A equipe planeja assimilar e testar rapidamente construções genéticas para ajudar os pesquisadores a compreender e aprender a revolucionar essas comunidades bacterianas que teoricamente matam tantas pessoas quanto o câncer e são a causa principal de infecção em todo o mundo.

A Microsoft também está iniciando uma colaboração com a Oxford Biomedica, empresa que desenvolve e fabrica terapias genéticas que possibilitam às células do paciente combater doenças debilitadoras e fatais. Ao trabalhar com os pesquisadores da Station B para identificar quais combinações genéticas e ambientais irão ajudar a tornar tal processo de fabricação mais produtivo, a Oxford Biomedica espera “diminuir dramaticamente os custos destes tratamentos transformadores e ampliar seu alcance para mais pacientes”, disse Jason Slingsby, diretor de Negócios da companhia.

“Se nós vamos atacar as doenças mais comuns, precisamos sair de centenas de doses de terapias orientadas por grupo para milhares de doses por grupo com o mesmo esforço”, disse Slingsby.

A plataforma também conta com um software desenvolvido pela Synthace, uma empresa de Londres que utiliza o Microsoft Azure para automatizar experimentos biológicos em vez de depender dos cientistas para fazê-los à mão. Isto permite aos cientistas ou aos fabricantes de remédios testar cenários mais complicados e reproduzir o mesmo experimento em diferentes configurações.

A infraestrutura de nuvem e as ferramentas de aprendizado de máquina do Azure podem rapidamente analisar dados experimentais e melhorar modelos que preveem como as células irão reagir quando uma sequência de DNA em particular for introduzida. Isto poderia ajudar os usuários a focarem nas melhores condições de fabricação de um remédio capaz de salvar vidas, ou de uma bactéria que fixa corantes em tecidos por meio de um processo não tóxico.

Definitivamente, uma base de conhecimento compartilhado poderia deixar as pessoas preverem como dispositivos genéticos – essencialmente segmentos de DNA fabricado introduzidos em uma célula – irão funcionar em novas situações, reduzindo a quantidade de tentativas e erros durante o desenvolvimento de novos processos ou produtos.

Ao modelar tais processos biológicos in silico, assim como os meteorologistas utilizam modelos de computador para prever o clima de amanhã ou onde os furacões podem aparecer, as ferramentas da Station B poderiam ajudar os cientistas a obter resultados promissores ou acelerar os processos de produção sem precisar testar cada cenário no laboratório.

Shama Chilakwad usa o software Antha
A cientista associada Shama Chilakwad usa o software Antha, da Synthace, e uma plataforma de automação para realizar experimentos no laboratório da companhia em Londres. (Foto: Jonatham Banks)

Transformando células em superfábricas de remédios capazes de salvar vidas  

As sedes da Oxford Biomedica possuem o formato de um anticorpo, um traço da empresa farmacêutica que projetou os prédios e usou tais proteínas para obter comportamentos benéficos nas células.

Atualmente, os fabricantes de remédios procuram tratamentos personalizados. Isso tem elevado os custos para descobrir e levar novos medicamentos ao mercado. Um dos ramos de desenvolvimento de medicamentos com maior índice de crescimento é a terapia genética, que utiliza ferramentas biológicas comumente criadas por uma cultura de células geneticamente projetadas.

A Oxford Biomedica, empresa separada da Universidade de Oxford há mais de duas décadas, possui várias dessas terapias genéticas e celulares inovadoras em desenvolvimento e também auxilia parceiros estratégicos a desenvolver e fabricar suas próprias terapias. Ela se especializou em criar o sistema de entrega que leva genes fabricados para dentro de uma célula – essencialmente uma partícula de vírus impossibilitada de espalhar doenças ou crescer, mas que utiliza seus mecanismos inteligentes de entrada para entregar uma carga terapêutica de genes benéficos.

Por exemplo, uma única remessa inserida no cérebro de um paciente com Parkinson introduz três genes que induzem as células alvo a produzir um neurotransmissor ausente chamado dopamina. Diagnósticos precoces se mostram promissores em ajudar a reverter os sintomas debilitadores da doença.

A empresa também está ajudando um parceiro a desenvolver um medicamento que conserte uma mutação genética nas células tronco de crianças com Síndrome de Imunodeficiência Combinada Grave (SCID) – por vezes conhecida como a Doença do Menino da Bolha de Plástico. O tratamento restaurou a função de imunidade em todas as crianças que foram tratadas periodicamente, transformando suas vidas e muitas vezes permitindo a elas frequentar a escola pela primeira vez.

A Oxford Biomedica também fechou um contrato com a Novartis para produzir o primeiro tratamento, aprovado nos EUA e na UE, que reprograma as células do sistema imunológico do próprio paciente para reconhecer e matar as células de câncer em pessoas com leucemia e linfoma.  O medicamento deve ser especificamente feito para cada indivíduo e custa em torno de meio milhão de dólares para tratar uma criança com leucemia linfoide aguda.

Antes do tratamento, tais crianças geralmente tinham poucas semanas ou meses de vida. Após receberem o tratamento celular, 81% das crianças em tratamentos clínicos receberam alta, sendo que o primeiro paciente a receber o tratamento está vivo seis anos depois.

“Há muita euforia sobre o que de fato a terapia genética pode alcançar. Ser capaz de salvar ou prolongar significativamente a vida de uma criança que nunca obteve sucesso com outros métodos é incrível”, afirmou James Miskin, diretor técnico da Oxford Biomedica. “Mas também tem havido muito interesse em reduzir os custos de fabricação para tornar essas terapias mais acessíveis a pacientes que sofrem com doenças mais comuns.”

Cientista trabalha no laboratório da Oxford Biomedica
Terapias genéticas, como as que Patience Brace desenvolve em seu laboratório da Oxford Biomedica, permitem que as células do próprio paciente lutem contra doenças, desde câncer e Mal de Parkinson a imunodeficiências graves. (Foto: Jonathan Banks)

O atual desafio da Oxford Biomedica é garantir que pode fazer doses suficientes de sua plataforma LentiVector® – o sistema insere genes fabricados em células humanas – para seus próprios produtos e os de seus parceiros. O objetivo principal é diminuir os custos dos tratamentos já existentes e atender à demanda crescente por novos, incluindo os que se concentram em órgãos maiores ou doenças que afetam milhões de pacientes.

“Para haver uma adoção democrática e ampla dos produtos da terapia genética, precisamos impulsionar a economia para que o custo seja aceitável para os pacientes e para que os sistemas de saúde possam adotá-los”, afirmou Slingsby. “Esta nova colaboração com a Microsoft deve nos permitir descobrir novas ideias sobre a melhor forma de configurar nossos sistemas para acelerar a produção e mantê-la nessa direção.”

A Oxford Biomedica está investindo em novas instalações e já conseguiu melhorar sua produção por um fator de dez. Para dar o próximo grande salto em produtividade, a empresa está contando com a Station B para melhor compreender, e consequentemente criar, a produção otimizada de células para a plataforma LentiVector.

A empresa consegue testar meticulosamente milhares de combinações de linhas celulares, material genético e condições do ambiente e escolher um vencedor entre elas. No entanto, seus cientistas ainda não conseguem saber por que uma combinação se saiu melhor do que todas as outras.

“Esses métodos de triagem, comumente usados por empresas farmacêuticas, entregam um resultado, mas não fazem você entender os motivos deles,” pontuou Paul Grant, biólogo sintético que comanda os experimentos no laboratório da Station B em Cambridge. “Você não consegue criar nada novo a partir destes casos de sucesso, porque não entende de fato como os fez. Nós estamos construindo a infraestrutura para mudar isso.”

A Oxford Biomedica coleta milhares de dados de experimentos e de cada processo de fabricação – desde movimentos de robôs de manuseio de líquidos até condições internas de biorreatores industriais e máquinas que misturam sistemas de produção, como um barman sacode um martini.

A equipe da Station B irá primeiramente aplicar sua experiência em modelagem e aprendizado de máquina nestes dados para compreender e prever melhor quais condições experimentais produzirão mais do vetor da terapia genética. Aumentar a produtividade da fabricação, produzindo mais doses de forma mais confiável e com menos esforço, deverá ajudar a reduzir o custo geral desses tratamentos.

Numa segunda fase, as equipes irão trabalhar para criar sistematicamente dispositivos genéticos – os equivalentes biológicos de programas de computador – para expandir interações benéficas e ajudar em comportamentos que possam transformar as linhas celulares da companhia de executoras confiáveis em superfábricas.

O biólogo Paul Grant da Microsoft Research em Cambridge
O biólogo Paul Grant da Microsoft Research em Cambridge, Reino Unido, faz experimentos no laboratório da Station B. (Foto: Jonathan Banks)

Construindo a plataforma Station B

O Grupo de Computação Biológica da Microsoft vem montando os componentes da plataforma Station B há anos.

Há quase uma década, Phillips e seu colega Michael Pedersen desenvolveram uma linguagem de programação que compila algoritmos biológicos para DNA em vez de código binário, de modo a influenciar o comportamento de uma célula. A partir desse trabalho inicial, o cientista da Microsoft Boyan Yordanov, especialista em ciência da computação e bioquímica, trabalhou com a equipe para desenvolver o protótipo de uma plataforma para criar, implementar e analisar algoritmos biológicos nas células. Ela também incorpora a habilidade de prever comportamentos baseada em modelos de simulação com dados, utilizando o sistema de aprendizado de máquina desenvolvido por Neil Dalchau, matemático que explora aplicações biológicas. Grant, biólogo que estudou como as células de peixes-zebra se organizam para criarem as listras, utiliza esse protótipo para criar e testar construções genéticas a fim de aprender como as células tomam decisões.

Sara-Jane Dunn, cientista da Microsoft e matemática, também desenvolve modelos computacionais para entender como as células tronco mantêm a habilidade e a prontidão de se transformar em outras células: do cerebro, pâncreas, pele, nervos, sangue. Ao reverter a engenharia desse processo, os cientistas da área esperam criar terapias com células tronco para tratar um portador de doença, desde a regeneração de órgãos até a reposição de neurônios cuja ausência contribui para o Mal de Alzheimer.

Mas influenciar sistemas biológicos não é como programar um sistema operacional ou um videogame. Não é como escrever uma receita – que envolve seguir uma sequência lógica de passos – e sim tentar descobrir as várias interações e processos paralelos que ocorrem numa sopa molecular barulhenta.

“Quando suas células estão tentando decidir entre algo saudável ou estranho, ou quando irão se dividir ou crescer, isso é essencialmente processamento de informações em nível molecular”, afirmou Dunn. “Nós tivemos que pensar em novos métodos para entender essa computação biológica e como induzir o sistema fazer o que queremos.”

Esses métodos de triagem, comumente usados por empresas farmacêuticas, entregam um resultado, mas não o fazem entender os motivos. Você não consegue criar nada novo a partir desses casos de sucesso porque não entende de fato como os fez. Nós estamos construindo a infraestrutura para mudar isso.

O poder da plataforma Station B reside em reunir todas essas peças do quebra-cabeça em um sistema integrado, disse Philips. Ambas as implementações iniciais ocorrerão em laboratórios supervisionados por reguladores de saúde, segurança, ética e médicos.

“Ela se combina com o profundo conhecimento da Microsoft em linguagens de programação, capacidade de modelagem e aprendizado de máquina com automação de laboratórios e o poder da nuvem e da fronteira inteligente – essa combinação de ferramentas não existe em nenhum lugar desse setor atualmente”, afirmou Phillips.

Para resolver um desafio importante, a plataforma usa o sistema de automação de laboratórios da Synthace para permitir aos usuários fazer experimentos a partir da nuvem e replicar precisamente cada passo em protocolos científicos complicados.

O software Antha da Synthace permite ao usuário trocar instruções subjetivas como “sacuda vigorosamente um tubo de teste” por linguagem digital não aberta a má interpretação e que robôs possam executar. Construída a partir do Azure IoT, Antha é uma linguagem de alto nível para descrever experimentos biológicos, os quais permitem um arranjo de máquinas de laboratório feitas para diferentes fabricantes usá-las, assim como drivers de impressoras permitem que qualquer modelo imprima documentos em PDF.

A habilidade de fazer experimentos exatamente da mesma forma em todas as vezes dá aos usuários a confiança de que os resultados obtidos são relevantes, e não apenas uma casualidade do dia em que o experimento foi realizado.

O sistema da Synthace – que pode lidar com experiências que testam dezenas de parâmetros diferentes e construções genéticas simultaneamente em vez de uma ou duas de cada vez – acelera o processo de pesquisa exponencialmente. Combinado com ferramenta de aprendizado de máquina, ele também dá aos clientes a habilidade de aprenderem com linhas de consulta muito mais sofisticadas.

“O poder quase infinito da biologia pode apenas ser liberado ao trazer a abstração e a automação do software para a pesquisa e o desenvolvimento biológico e fabril, e por permitir aos biólogos desenvolverem sobre seu trabalho coletivo. Isso é o que a plataforma Antha faz com sucesso”, disse Tim Fell, CEO da Synthace.

Sarah-Jane Dunn, cientista da Microsoft Research
Sarah-Jane Dunn, cientista da Microsoft Research em Cambridge, Reino Unido. (Foto: Jonathan Banks)

‘Isso poderia ter um alcance enorme’

A plataforma Station B será testada primeiramente no laboratório de Bonnie Bassler, presidente do Departamento de Biologia Molecular de Princeton, pesquisadora do Instituto de Investigação Médica Howard Hughes, reconhecida com o Prêmio MacArthur, que estuda como as bactérias exercem um poder descomunal ao agir como um coletivo. O time de Princeton inclui Ned Wingreen, colaborador de longo prazo de Bassler, físico e professor no Instituto Lewis-Sigler de Integradores Genômicos de Princeton.

“Historicamente, nós pensávamos que a bactéria só possuía comportamentos maléficos, como nos infectar e nos trazer doenças, mas, recentemente, os cientistas descobriram o microbioma, uma comunidade bacteriana quase mágica que vive dentro e fora de nós e nos mantém vivos”, afirmou Bassler. “O que meu laboratório sempre se perguntou é como as bactérias conseguem ou nos matar ou nos manter vivos? Elas são tão pequenas.”

Bassler descobriu o amplo uso de um fenômeno chamado “detecção de quórum” no mundo bacteriano. É uma forma de comunicação molecular que as bactérias usam para determinar quando sua quantidade atingiu massa crítica. Quando elas chegam ao “quórum”, elas desencadeiam comportamentos que só dão certo quando as bactérias agem como um grupo coordenado – como liberar doenças virulentas.

Em um projeto piloto de prova de conceito, a equipe irá implementar a plataforma Station B para investigar como as bactérias de cólera utilizam a detecção de quórum para formar biofilmes, camadas finas de bactérias que crescem em quase todas as superfícies. Uma bactéria vivendo em comunidades de biofilmes pode ser 1000 vezes mais resistente a antibióticos do que uma bactéria não biofilme.

Os pesquisadores de Princeton usarão a plataforma Station B e as ferramentas de automação de laboratório da Synthace para construir e testar diferentes versões de duas proteínas chaves para a formação de biofilme – também programada geneticamente para se acender. A luz permite que os cientistas vejam e meçam o quanto de cada proteína é produzido em diferentes condições e regiões de biofilme.

Bassler compara os microbiólogos que trabalham em seu laboratório a artesãos mestres, criando elegantes e complicadas construções genéticas para produzir o resultado desejado. No entanto, esse processo artesanal rende poucas perspectivas por tentativa e não permite à equipe atacar o problema em larga escala.

A plataforma Station B conseguirá construir e testar dezenas de proteínas fabricadas de uma só vez – em quaisquer combinações que um pesquisador possa imaginar e inseri-las no sistema para que um robô manipulador de líquidos produza. A plataforma irá então auxiliar os cientistas a aprenderem qual das construções das proteínas comportam-se de forma mais parecida com as naturais e produzem uma relação precisa de como as células de biofilme se organizam, disse Bassler.

O objetivo é desenvolver sobre esse conhecimento básico e encontrar um calcanhar de Aquiles que possa enfraquecer biofilmes virulentos ou ampliar sua sensibilidade a antibióticos.

“A plataforma nos permitirá fazer mais perguntas, obter mais resultados e fazer mais experimentos do que um aluno da graduação ou de pós-doutorado, não importa o quão inteligente, possa fazer hoje. Então, cabe a nós vencermos a construção genética mais rápido”, pontuou Bassler.

Igualmente importante, a plataforma irá também coletar e ajudar a analisar dados dos experimentos de cada laboratório – incluindo os que falham, disse Bassler. Por necessidade, cientistas têm de perseguir suas linhas de investigação mais frutíferas, mas isso pode deixar um tesouro inexplorado de informação sobre o motivo de algo ter dado errado.

“Se essa informação extra pode nos ajudar a descobrir os padrões escondidos sobre o que funciona e o que não e o porquê, isso seria um salto transformador para nós”, disse ela.

O valor de implementar a plataforma Station B no laboratório de Bassler é que os pesquisadores já construíram um inventário extensivo de componentes genéticos, misturas químicas e modelos durante os anos em que estudaram bactérias, como a que causa cólera.

Se a equipe conseguir desvendar as regras e princípios que regem tais sistemas, disse Wingreen, eles podem ser capazes de programá-los de maneiras transferíveis. Potencialmente, isso poderia permitir a um médico que estuda câncer ou a um engenheiro trabalhando em combustíveis de baixa emissão de carbono a imaginar uma construção genética que eles adorariam testar e obter uma pista exata de como assimilá-la – sem precisar passar anos em uma mesa de laboratório.

“Da minha perspectiva, isso poderia ter um alcance enorme”, afirmou Wingreen. “Assim como o setor de tecnologia foi democratizado por um software que permite perguntar o que você quiser num microchip e ainda ter alguém para construí-lo, precisamos deste tipo de revolução na biologia.”

Imagem do topo: Breech Odu trabalha em um laboratório da Oxford Biomedica, onde a plataforma Station B será implementada para acelerar a descoberta e a produção de terapias genéticas e celulares. (Foto: Jonathan Banks)